Entrevista: Carmen Silvia Penha Galluzzi
Atenta à necessidade de tornar produtivas as reuniões de pais, a psicóloga educacional dedicou um livro ao assunto.
Aquelas reuniões de pais intermináveis, com hora para começar mas sem hora para acabar, cansativas e pouco produtivas podem dar lugar a encontros agradáveis. Em busca desse objetivo, a psicóloga educacional Carmen Silvia Penha Galluzzi escreveu o livro Propostas para Reunião de Pais – Estratégias e relatos de casos (Editora Edicon), rumo à terceira edição.
O livro nasceu da experiência de Carmen Silvia como palestrante do Sindicato dos Estabelecimentos de Ensino no Estado de São Paulo (SIEEESP), ministrando o curso Reunião de Pais – como organizá-las. Já foram 60 cursos, totalizando 2500 educadores atentos ao assunto. Carmen percebeu, então, o quanto professores, coordenadores e diretores estão interessados em organizar melhor suas reuniões de pais e sistematizou as informações de que dispunha no livro.
Para a profissional, a escola deste milênio está aberta aos pais, mas é preciso que ambos – escola e pais – aprendam a utilizar esse espaço. Psicóloga educacional da Organização Educacional Margarida Maria (OEMAR), em São Paulo, Carmen parte do princípio de que as reuniões de pais servem para abordar assuntos relativos ao grupo de alunos e nunca pode ser ameaçadora. Nesta entrevista a Direcional Escolas, ela fala sobre a importância do objetivo da reunião, dos temas abordados, da forma como é feito o convite, entre outras dicas e detalhes que podem fazer a diferença.
DIRECIONAL ESCOLAS – Por onde o educador deve começar ao organizar a reunião de pais de sua escola?
CARMEN SILVIA PENHA GALLUZZI - O importante é ter bem claro qual o objetivo da reunião. Eu sugiro uma reunião anterior ao início do ano letivo para que os pais conheçam os professores antes dos próprios filhos. A adaptação diz respeito a todos os envolvidos no processo escolar, não só às crianças e adolescentes. Essa reunião tem como objetivo passar assuntos gerais. Funciona como um acolhimento das famílias, explicando quais são os objetivos da escola, como cada série trabalha e como os pais podem ajudar seus filhos. É como um contrato. Indico receber os pais com uma dinâmica ou com um texto. A acolhida, quanto mais preparada e sincera, será melhor para que os pais percebam o ambiente onde seus filhos irão estudar. Já uma reunião de primeiro bimestre ou primeiro trimestre é mais voltada para questões pedagógicas, porque os filhos já tiveram uma caminhada na escola e os pais anseiam por esse retorno de como eles estão pedagogicamente. Se é uma reunião do segundo trimestre, quando já não existe uma expectativa tão grande em relação às notas, porque isso foi tratado na primeira reunião, pode-se fazer um encontro voltado para algum tema específico. A escola pode decidir ou pedir que as famílias decidam o tema.
Dê alguns exemplos de como esses temas podem ser desenvolvidos.
São reuniões temáticas desvinculadas das reuniões pedagógicas. Essa proposta deve ser adaptada à filosofia da escola. Alguns temas que podem ser abordados são: limites, auto-estima, orientação sexual, orientação vocacional, stress infantil, até temas da atualidade, como dengue ou violência. Temas específicos para cada faixa etária são muito bem recebidos. Por exemplo, no primeiro trimestre, para o Ensino Fundamental I, pode-se tratar de orientação de estudos. Uma idéia é fazer um inventário de interesses com a criança na sala de aula. Quando os pais chegarem na reunião responderão a algumas questões e depois vão confrontar com o que o seu filho respondeu. Isso é uma motivação inicial para os pais, que perceberão o quanto estão acompanhando seu filho, o quanto conhecem a proposta pedagógica da escola.
Os pais têm receio de serem expostos no grupo?
É claro. O rendimento do seu filho não interessa para outra família. Por isso é preciso fazer um atendimento individual antes e convidar esses pais para uma reunião geral. Todos os casos que possam apresentar algum tipo de dificuldade na reunião geral, por exemplo, se a criança apresenta alguma queixa em relação à aprendizagem ou de relacionamento com os colegas, devem ser tratados individualmente com os pais. Nosso objetivo é chegar ao aluno. Quando falamos da reunião de pais, é porque eu quero ter essa família próxima da escola. Se família e escola estiverem juntas durante o processo os resultados serão mais satisfatórios em relação ao aluno. A escola deixa de ser ameaçadora para essa família. Cito o caso da OEMAR: na primeira reunião do ano, para Ensino Fundamental I, tivemos em média 77% de presença dos pais, em reuniões durante a semana, de manhã e à tarde.
O fato de marcar antecipadamente reuniões individuais pode acarretar um efeito inverso e fazer com que os pais não compareçam à reunião de grupo?
Não é o que eu tenho observado. A escola chama os pais individualmente desde fevereiro, enquanto a reunião de grupo é em maio, por exemplo. Aliás, para o atendimento individual os pais recebem uma convocação, enquanto para a reunião é um convite, o que é bem diferente. No convite da reunião geral deve ser deixado claro que serão tratados assuntos do grupo, diretamente com a professora. Os pais têm muita curiosidade em saber como o filho é em relação ao grupo e como o grupo é em relação ao filho. É importante saber que outros pais têm as mesmas preocupações e vivem as mesmas ansiedades, da mesma faixa etária. A realidade tem me mostrado que o fato de tratar individualmente questões da criança deixa os pais mais seguros e tranqüilos para estar na reunião geral. O pai sabe que lá isso não será abordado e a reunião deixa de ser ameaçadora.
Qual a freqüência ideal para as reuniões?
Atualmente, três reuniões gerais durante o ano são suficientes, deixando espaço aberto para atendimentos individuais e reuniões temáticas, desvinculadas do pedagógico. O ideal é que as reuniões sejam agendadas no início do ano e façam parte do calendário escolar. O interessante, sempre, é surpreender os pais, quebrando os paradigmas. Deve haver bom senso no uso de tecnologias. Pode-se aproveitar os recursos visuais que a escola possua. E, se não tiver, pode ser preparado um mural, um cartaz. Fazer uma lista de presença é importante para perceber qual a reunião de maior freqüência, enfim, qual a expectativa dos pais.
A escola também deve preparar reuniões para os pais do Ensino Fundamental II e Ensino Médio?
Sim. A freqüência dos pais diminui e a reunião tem um perfil diferente, até porque nessa faixa etária o objetivo dos pais é desenvolver a autonomia do filho. O mesmo tema pode ser abordado no Ensino Fundamental I, Fundamental II e Médio. Mas o principal é definir o objetivo da escola com a reunião e conhecer bem o grupo de pais que será atendido. Numa reunião de quinta a oitava séries, por exemplo, é muito desagradável expor os pais a uma longa espera para serem atendidos individualmente por cada professor. Sugiro em meu livro algumas estratégias, como a distribuição de senhas, que agilizam esse processo, evitando aquelas conversas paralelas entre os pais na fila. A escola pode até se antecipar à ansiedade dos pais, marcando reuniões preventivas, no ano anterior às séries consideradas como de transição, como primeira, quinta e sétima, do Fundamental II, e primeiro ano do Ensino Médio.
Em seu livro, a senhora sugere desvincular a reunião da entrega de notas. Como se dá esse processo?
Mais uma vez eu digo que é preciso amadurecer essa decisão com a equipe da escola. Não adianta só tirar a nota da reunião e não saber o que colocar no lugar. Se o pai vai para a escola só para receber nota, qualquer um pode estar no lugar dele. Ele vai para uma reunião de pais para receber muito mais do que nota. O boletim pode ir com antecedência para casa. Ele comparece à reunião ciente das notas, e sabendo com quais professores ele quer conversar, no caso do Fundamental II. Agora, é preciso adaptar isso a cada escola, avaliar se a freqüência vai cair. Algumas escolas ficam preocupadas se, desvinculando a nota da reunião, diminuirá a presença dos pais. Não é o que as estatísticas que tenho têm me mostrado. Uma reunião só com entrega de notas é que tem baixa freqüência de pais, porque a escola pensa nos pais que não vão e faz uma reunião trivial, e não um encontro para superar expectativas.
Como definir o perfil dos pais atendidos?
Deve-se pensar em absolutamente tudo em relação ao grupo de pais: se trabalham fora, em que horário trabalham, idade dos pais e dos filhos, formação, religião, expectativa deles em relação à escola. Com essas características a escola monta um perfil. É possível ter uma classe onde a maioria das crianças são filhos únicos. Essa característica gera uma diferença no perfil da classe. É importante definir o perfil dos pais para compreendê-los, e até para abordar um tema adequado. Se pretendo fazer a reunião de manhã, mas sei que os horários de trabalho desse grupo não são flexíveis, há o risco deles não comparecerem.
O tema da reunião deve estar de acordo com a proposta da escola?
Antes até do tema escolhido, a escola deve encontrar a forma de reunião em que ela acredita. Se a escola não estiver preparada para tirar a entrega de notas da reunião, então não deve se sentir obrigada a tirar. Eu devo amadurecer primeiro isso com a equipe. Adaptar a reunião ao jeito de ser da instituição. Dicas de aspectos gerais, porém, são importantes para os pais e independem da proposta da escola. Pensar no tema, em como abordá-lo, ter a pauta em mãos, conhecer o perfil de pais, marcar horário de início e término. Isso tudo vai trazer muita segurança ao encontro. Administrar o tempo é fundamental. Duas horas de duração e, dependendo da reunião, uma hora, já é suficiente. É inviável ir para uma reunião sem saber a que horas ela vai terminar. Por melhor que ela seja, se torna cansativa.
A senhora recomenda que a escola convide um especialista de fora para abordar um tema?
A escola pode trazer um convidado. Contratar algum especialista dá um retorno muito bom para a escola. Às vezes, a escola até já fala sobre a questão, mas é alguém que não está no dia-a-dia da escola que irá falar. Os pais se sentem agradecidos pela escola ter chamado uma pessoa para abordar certos assuntos. Tive preocupação, no livro, em mostrar que a própria escola pode fazer isso. Pode até haver no grupo de pais um profissional indicado para tratar de um tema. Por isso também é importante conhecer o grupo de pais.
A escola deve se organizar para receber as crianças no dia da reunião, caso os pais não tenham com quem deixá-las?
Eu não recomendo. Porque se a escola se organiza para receber as crianças, os pais vão continuar levando as crianças para as próximas reuniões. As professoras têm como foco, nesse dia, receber os pais, e não as crianças, o que dificulta todo o controle dessa situação. Se a reunião acontece num dia letivo, é indicado comunicar no convite que esse dia é destinado a receber os pais. Isso deve ser trabalhado com os alunos em sala de aula. A escola parou o seu dia com os alunos por ser tão importante receber os pais. Se a escola deixá-los jogar bola, passar um filme ou colocar uma auxiliar à disposição no dia da reunião, cria-se a cultura de que não é para levar a criança, mas se levar tem alguém para cuidar. A própria criança irá perceber que não é divertido vir para a escola nesse dia.
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